A fé que dá “lucro”

Grandes empresas não contratam pessoas qualificadas e as motiva. Elas contratam pessoas já motivadas e as inspira.”

Simon Sinek

Quando Shakespearedescreveu a batalha de Bosworth, na obra Ricardo III, jamais imaginouque suas linhas pudessem atravessar os séculos e nos alcançar hoje,nesse mundo agitado e inundado de tanta gente conectada, comimpaciente sede de informações. Ao perder sua montaria em plenaluta o rei, desesperado, exclama a célebre frase: “Meu reino porum cavalo”. O Monarca nos ajuda a ilustrar um interessante cenário:quanto estaríamos dispostos a pagar para não perder uma guerra?

Vamos pegaremprestados alguns elementos semióticos e criar uma nova cena.Imaginemos que o rei seria um CEO, gerente, coordenador ou presidentede alguma empresa, e o seu cavalo, aqui, seria a sua equipe detrabalho. Claro que guardadas as devidas proporções. Como um líderpoderia realizar objetivos, conquistar missões, concluir projetos ousuperar metas se o seu capital humano não está devidamenteengajado, se as pessoas ao seu redor não compartilham sonhos, se asua equipe apenas aguarda a hora de bater o ponto e voltar para casaou ir para o happy hour?

Procura-se homenspara viagem perigosa, dizia o anúncio. E seguia, “saláriosbaixos, frio intenso, longos meses de completa escuridão, perigoconstante, sem garantia de retorno. Honras e reconhecimento em casode sucesso”. Esse era o texto publicado por Ernest Shackleton,em 1913. O explorador precisava de uma tripulação para operar oEndurance, o navio que os levaria até a Antártida, para a primeiratentativa de travessia do pólo sul. Qualquer pessoa, em sãconsciência, sabe que esse seria um empreendimento insólito. Resumoda ópera: encalharam no gelo por 10 meses, até conseguirem usar osbotes salva-vidas e aportar na Ilha Elefante, às portas docontinente congelado. Shackleton deixou sua tripulação em terramenos 5 homens, e partiu mar adentro, por cerca de 1300km em águasviolentas, em busca de socorro, o que eventualmente acabouencontrando.

Moral da história:quase todos sobreviveram, mas não foi um golpe de sorte. O filtrousado para selecionar as pessoas certas para o desafio garantiu quesaíssem todos vivos. Ninguém entrou no Endurance para se divertir.Todos estavam lá conscientes dos perigos que, certamente, viriam, adespeito de salário. Isso garantiu que as outras expedições fossemmais bem planejadas, trazendo sucesso ao empreendimento. Tenhocerteza de que Shackleton não trocaria a sua tripulação por nadanessa vida. Uma empresa que seleciona funcionários pela capacidadeemocional de se envolver com seus valores, pode subir no barco, içarvelas e seguir viagem, sem temer qualquer tipo de desafio. Semprehaverá oportunidade de aprendizado, pois todos querem a mesma coisae estarão dispostos a tentar de novo.

Você seria capaz degritar a plenos pulmões “minha empresa por uma equipe dessas”?

Camaradagem: Uma Catedral Além do Infinito

O sentimento quetemos ao fazer qualquer coisa na vida é a sua própria definição.Ou seja, a qualidade de nosso trabalho depende exclusivamente do tipode devoção que aplicamos nele. Dois escultores podem criar peçasem pedra, mas apenas um deles acredita que elas se tornarão aCatedral que estão ajudando a construir; um lugar único e digno deser visitado. Talvez o outro escultor esteja apenas quebrando pedras,cumprindo obrigações em troca do salário que pagará suas contas.Essa história se repete em campos de futebol, bancos, lojas,indústrias, clubes, galerias de arte, estúdios, escolas, agênciasde publicidade, plataformas de petróleo, supermercados, etc.

De acordo comescritor Simon Sinek, empresas com um forte senso de PROPÓSITO sãocapazes de inspirar seus funcionários, que são mais produtivos einovadores; e o sentimento que trazem para o trabalho atrai outraspessoas, ansiosas para trabalhar lá também. “Não é por menosque as empresas que mais amamos são também os melhoresempregadores”, afirma. Segundo ele, quando as pessoas dentro daempresa conhecem a RAZÃO de irem para o trabalho, estarão maispropensas a entender porque a empresa é especial. “Nessasorganizações, de cima para baixo, ninguém se acha melhor, poisacreditam que todos precisam uns dos outros”, finaliza.

Quando a equipeentende o motivo maior de existir da empresa, acabam por compartilharum sentimento genuíno de camaradagem*, o que representa atroca de confiança mais poderosa na construção sustentável de umnegócio de sucesso. E não se engane, esse sentimento será semprefruto de uma cultura estimulante, que agrupa as pessoas certas e asinspira sempre para a liberdade pessoal de interagir com a equipe,conhecendo seus talentos e limites, na esperança de semprecontribuir com o todo.

Ed Catmull, uma dasgrandes mentes da Pixar, diz que se você der uma boa ideia para umaequipe de gente medíocre, eles vão estragá-la. Mas, “se der umaideia medíocre para uma equipe de gente brilhante, eles irãoconsertá-la ou jogá-la fora e propor algo melhor”, defende. Parao coordenador das equipes que criaram filmes inesquecíveis como ToyStory, Carros, Wall-E, Procurando Nemo, Os Incríveis, dentre outros,a sinergia entre as pessoas envolvidas no processo criativo de umprojeto é condição sine qua non para o sucesso verdadeiro.

As pessoas precisamconhecer a paixão que as move para o trabalho, e isso vai mantê-lasunidas.

O escultor que vêuma catedral em cada pedra que lavra seria o único capaz de inspirarde verdade outras pessoas. Gente que investe emoção no que fazpossui um magnetismo sedutor. Essas pessoas dividem o pão, a alegriado que fazem e emprestam a sua genialidade para garantir o sucessoalheio, pois não acreditam ser diferente disso. É inevitável a suaenergia. Tudo o que fazem chama a atenção, incomodam, mexem comnossos olhos, nossos corações. Tudo o que fazem nos move sempre aoinfinito, e além…

* Esta palavratem uma história interessante. Em Grego, KAMÁRA era uma parte deuma construção com um arco, um lugar abobadado. Esse nome passoudepois a designar um aposento para dormir, o que hoje conhecemos comoquarto. Em épocas em que a lei não era muito expedita para puniragressões, só se podia dormir no mesmo aposento com outra pessoa sehouvesse muita confiança nela (eram épocas em que as construçõesdispunham de poucos quartos isolados). Daí que um “camarada”, emseu sentido original, era uma pessoa em quem se podia depositarconfiança.

Ironia do sucesso: voa alto quem leva mais gente junto

Samuel PierpontLangley: ele reuniu algumas das mais brilhantes mentes da época. Seu‘Time dos Sonhos’ incluía o piloto de testes Charles Manly, umengenheiro mecânico, treinado pela Universidade Cornell, e StephanBalzer, desenvolvedor do primeiro carro em Nova York. Langley e suaequipe usaram os melhores materiais, e as condições eram perfeitas.Além disso, o jornal New York Times o seguia por toda parte. Todomundo conhecia Langley e estava torcendo por seu sucesso. Mas haviaum problema… Ele era inteligente e motivado, ele tinha o quedefinimos como a receita para o sucesso: muito dinheiro, as melhorespessoas e condições de mercado ideais. Mas poucos de nós, hoje,ouvimos falar dele.

O que deu errado?

Motivação vem daideia de termos um “motor” interno, que nos move. Motivação vemde um conceito que reza sobre os princípios que queimam no coraçãoe estimulam a mente na direção de nossos desejos. Langley, comoconta a história, queria, de todas as formas, apenas se tornar ocara que criou o avião.

Tudo estava a seufavor, mas ele não conseguiu. Dois irmãos pobres de Ohio, donos deuma lojinha de bicicletas, se juntaram com alguns amigos (nenhum comcurso superior) para criar algo que acreditavam poder revolucionar omundo. Mas, ao contrário de Langley, mesmo sem dinheiro,conhecimento científico e as câmeras do jornal mais famoso dosEstados Unidos, criaram a primeira máquina mais pesada que o arcapaz de voar.

No dia 17 dedezembro de 1903, os irmãos Wright provaram que a simplicidade desuas intenções iriam mudar o mundo. Eles não queriam apenas ficarfamosos. O seu desejo era poder oferecer algo que ajudasse a melhorara vida das pessoas. Langley desistiu, quando descobriu que tinha sidosuperado por dois mecânicos de bicicleta sujos de graxa. Foi o fimpara um cara que buscava apenas a fama, como quem deseja, hoje, criarum aplicativo revolucionário visando grandes fortunas.

A paixão que colocamos em tudo o que fazemos define como vamos alcançar o sucesso. E não se engane, sucesso não é montanhas de dinheiro e fotos expostas na Internet. Sucesso é um amante da palavra “clássico”, ou seja, tudo aquilo que se reinventa e atinge as pessoas, sem perder valor e força, uma criação humana que não depende do tempo. Quando temperamos nossas ideias com a dose certa de paixão, nada e nem ninguém consegue nos impedir de dar o recado ao mundo, e escrever nossos nomes na história.

Basta ter fé. Um sentimento genuíno. A certeza de que o sonho não é só nosso, mas de toda uma geração ou, talvez, quem sabe, de toda a humanidade.

Updater: William Barter

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