Infidelidade, privacidade e internet

O asmático é o único que não trai, disse Nelson Rodrigues em seu conto “Homem Fiel” da Vida Como Ela É. Naquela época ainda não existia a internet de hoje e muito menos os sites e aplicativos de relacionamento, conhecidos como matchmakers.

Muita coisa mudou no mundo do amor do final do século passado pra cá. Vemos cada vez mais a mercantilização das relações e as escolhas em prateleiras com filtros de idade, altura, religião e cruzamento de dados com redes sociais.

Se o desejo é sempre triste, como afirmava o mesmo Nelson, as nossas prateleiras contemporâneas mostram que a facilitação de suas realizações está deixando as novas gerações mais perdidas e mais sedentas por novas experiências.

Escrevo isso, pois hoje saiu uma notícia que está no #trendtopics, que o matchmaker americano Ashley Madison, sofreu um ataque e teve vazamento de dados. Não é a primeira vez que isso acontece na internet, mas acontece que esse site é especializado em “puladas de cerca” e conta com quase 40 milhões de usuários cadastrados no mundo. Ele funciona como uma espécie de e-commerce de serviços, onde o usuário cadastra seu cartão de crédito e então tem permissão para conversar com outras pessoas dispostas a cruzar o muro.

Não faço uma defesa à infidelidade e nem à asma. Também não comemoro com um “bem feito” que muitos perderão amores e família, pois acredito que cada um tem seus motivos para ser infiel assim como cada um tem os seus motivos para ser fiel; mas a privacidade e a segurança prometida pelo site que atrai seu público sob o slogan “A vida é curta. Curta um caso” deve ser garantida. Tenho certeza que para muitos usuários do Ashley Madison, a segurança neste caso é mais importante do que a de um banco, por exemplo.

Ouso dizer que é certa a queda de outros sites do estilo e que no caso do site em questão, até a falência não deve ser descartada.

A vida privada, não a pública, é a verdadeira vida como ela é. E a sexualidade e as fantasias sempre têm as senhas mais complexas em nossos cofres interiores. Buscamos segurança em um mundo pautado pela liberdade, mas não existe diálogo entre as duas coisas, existem berros.

Privacidade e segurança são coisas de extrema importância na era digital, mas alguém despreocupado com essa notícia é o melhor presente que o mundo pós-moderno pode nos dar.

Updater: Tiago Souza

Reply

or to participate.