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Influenciadores: por que a culpa é sempre de quem paga?

Nesta terça, a Thaeme postou uma foto dela mesma no Instagram dizendo estar ansiosa, com o coração apertado e torcendo pelo hexa da seleção brasileira – eliminada semana passada pela Bélgica, que foi quem realmente jogou hoje. Talvez você nem saiba quem é a pessoa, mas ela canta numa dupla sertaneja de sucesso, tem três milhões de seguidores na sua conta pessoal e outros 1,8 milhão na da dupla (Thaeme e Thiago). E só isso já é o suficiente para trazer com ela uma penca de marcas. Não deveria, mas é.

Não é de ontem que anunciantes dos mais diferentes tamanhos se amontoam pedindo carona nos números de seguidores, likes, comentários e outros supostos índices concretos de popularidade dos “influencers”. Essa é uma estratégia extremamente válida quando feita com cuidado, planejamento, inteligência e propósito, mas tem cada vez mais se traduzido em exploração vazia de garotos-propaganda descartáveis, na era do conteúdo que, teoricamente, some em 24 horas. Teoricamente.

A polêmica envolvendo o youtuber Julio Cocielo após piada racista envolvendo o jogador francês Mbappé, que segundo ele “conseguiria fazer uns arrastão top na praia”, desencadeou uma discussão que deveria ser a mais básica em qualquer estratégia que use terceiros representando sua marca: essa pessoa combina comigo? Assim como os mídias clássicos estudavam público, viés, horários, programas e até posicionamento na hora de colocar um comercial em TV ou anúncio em revista, indo muito além dos números brutos de audiência, é preciso saber que perfis bombados de Instagram, Twitter ou qualquer outra rede funcionam sim como mídia, mas trazem muito mais coisa envolvida.

Se nem a Xuxa conseguiu apagar “Amor, estranho amor” da internet, pode ter certeza: tudo que foi publicado um dia, um dia reaparece. E se qualquer um que fuça com mais vontade encontra postagens questionáveis em perfis que vão desde blogueiras pseudo-famosas a estrelas da Globo, é fundamental que seu parceiro de marketing de influência faça o mesmo. Mais do que isso, passou da hora das marcas descobrirem que influência tem pouquíssimo a ver com volume, com views ou com surfar sem rumo numa onda popular que apareceu em uma rede qualquer.

Ao ter não uma, mas uma dezena de mensagens extremamente questionáveis descobertas, Cocielo perdeu contratos com Itaú, Adidas, Coca-Cola e outros grandes patrocinadores, além de ficar extremamente queimado para futuros contratos – ao menos no curto prazo. Bruno Gagliasso, que engrossou o coro contra a postura do influencer, sofreu com teto de vidro, teve mensagens homofóbicas antigas expostas, mal estar com Itaú e rompimento com a Prefeitura do Rio, para a qual participava, veja só, de campanha em prol da causa LGBT.

Óbvio (e felizmente), quem sofre mais com a situação é o próprio autor das barbaridades. Mas se você acha que ter alguém questionável como representante da sua marca passa ileso pela percepção do público, é melhor olhar com mais cuidado.

Como fazer melhor?

Com a cabeça antiga de “paga e aparece”, muitas marcas tem explorado os influenciadores da pior forma possível, seja tentando enganar o público – como se alguém na vida real postasse com orgulho e vontade própria a pasta de dente que escolheu para clarear seus caninos – ou transformando a timeline alheia em uma sessão de merchans adaptados para o formato digital, num esquema meio “Top Therm 2.0”. A própria Thaeme, citada lá em cima, pouca culpa teve em relação ao post torcendo pelo impossível hexa, nascido da frieza de uma equipe “treinada” e dedicada a fazer postagens aleatórias (e muitas vezes programadas, como a de hoje) para manter os algoritmos aquecidos.

Uma lição valiosa aprendida com cases recentes de sucesso é que o público não se importa se tem uma marca envolvida ali, contanto que o conteúdo será realmente interessante (engraçado, emocionante, informativo, dependendo de cada perfil e estratégia) e que, acima de tudo, não tente enganar quem está o consumindo. Mostrar de forma clara e inteligente que trata-se de uma campanha é muito menos pecaminoso que maquiar uma capivara e postar com a hashtag #SouUmPanda.

https://www.instagram.com/p/Bk5rFg4gpsq/?taken-by=iamzlatanibrahimovic

Ibrahimovic certamente não precisa da sueca Ikea para mobilhar sua casa, mas usou sua influência, bom humor e relacionamento com Beckham para fazer uma ativação que virou notícia e atraiu mais de dois milhões de curtidas

O inverso também é um grande problema: não é porque você está pagando que o logo, o produto ou o discurso tem que ser só sobre você. Se quer fazer publicidade, faça um banner, não uma ação de influenciadores. A audiência desse pessoal quer saber deles, da vida deles, do que eles têm a falar ou ensinar. Se uma marca o  ajuda a fazê-lo, ganha simpatia. Se força ou interrompe, passa vergonha.

Outro erro razoável é tentar definir sozinho o que será dito, como será dito e quando será dito. Você, agência ou marketing, pode saber tudo sobre a sua marca ou produto, mas quem sabe a linguagem, o horário, o que e como aquela audiência gosta, é o próprio influenciador. Senão, ele não teria conquistado o público que você quer atingir investindo nele. Não envolver a porta-voz escolhida em todo o processo (e muitas vezes ceder ao que ele indica), é no mínimo desperdício de potencial em resultado.

Amarrar mal a estratégia com o influencer é outro tiro freqüente no pé, tanto quanto escolher errado. Nesta copa, dezenas de @’s famosas foram para a Rússia patrocinadas por marcas das mais diversas. Em pelo menos três exemplos, enquanto elas bombam seus próprios perfis de conteúdo bacana, novos seguidores e experiências pessoais incríveis, as marcas são deixadas de lado em troca de meia dúzia de postagens vazias, sem contexto e exibição pobre do produto.

https://www.instagram.com/p/Bk4yO5klcOd/?taken-by=zalbar_1984

A Brahma levou o torcedor mais famoso da Copa para ver o jogo do Brasil, sem ter que vesti-lo com um logotipo enorme da marca: uma camiseta bacana, uma hashtag e um bom trabalho de RP fizeram valer a ação

E uma das mais básicas, mas que foi perdida pelo conceito antigo e equivocado de audiência, é em relação a números. Escolher influenciador por número de seguidores é tão vazio quanto escolher cônjuge por conta bancária. Se nós mesmos vamos visitar restaurantes que UM amigo nos indicou, mesmo sendo impactados centenas de vezes pela publicidade de tantas outras opções gastronômicas, porque a quantidade na hora de fazer comunicação vale mais que a qualidade?

Para que haja a tal da “influência”, o “canal” escolhido precisa cativar, conquistar credibilidade, mostrar conhecimento do assunto tratado, persuadir de forma natural, ser espontaneamente convincente. Isso pode acontecer com um Cristiano Ronaldo da vida, diante dos fãs incondicionais que fariam qualquer coisa que ele pedisse, mas também podem acontecer com um mero entusiasta sobre o tema que sua marca quer explorar, com sua meia dúzia de seguidores.

A culpa é sempre de quem paga

A maioria das estratégias de influenciadores atualmente são feitas de marcas com pessoa física. E pessoas físicas erram, fazem besteira, às vezes evoluem, às vezes não, sabem trabalhar profissionalmente ou não sabem, convencem ou não convencem, são naturais, são bons atores ou são bizarrices criadas por um consumo frenético de redes sociais.

Mas como pessoas físicas, cada um faz o que quer, como quer, e arca com as consequências. Escolher se vincular profissionalmente com elas é responsabilidade única e exclusiva de quem toma essa decisão, assume o risco (SEMPRE haverá risco) e usa a criatividade, a estratégia e o embasamento necessário para minimizá-lo.

Assim como o relacionamento entre duas pessoas, a gente decide quem vira colega, amigo, sócio ou parceiro depois de muita análise, teste, aproximação moderada, até a decisão final. Qualquer semelhança com as decisões comerciais não deveria ser mera coincidência.

Updater: Karan Novas

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