Pense: fora da caixa?

Atualmente, ouvimos a expressão “pense fora da caixa” mais vezes do que recebemos “bom dia”. Pode acreditar. Na hora de escrever um curriculum, a maioria de nós sofre para criar a melhor versão possível, capaz de seduzir aquela pessoa que tem pilhas e pilhas de papel ou e-mails para ler, e que tem nas mãos o poder de decidir o destino profissional do dono daquela folha de papel. Aposta alta demais.

Afinalde contas, o que é essa tal caixa? Quando ouvimos a tétrica expressão “pense fora…”,nos sobe um calafrio. Sim, a ideia parece sombria o suficiente para assustarquem quer que receba o famigerado convite para pensar fora de um quadrado malexplicado.

Oque incomoda bastante é que as pessoas que nos exigem o sacrifício de sair deum confortável cubo, onde as leis da física nos são familiares, assistem nossaspiruetas, confortavelmente, de um camarote aveludado, dentro do mesmo lugar deonde devemos sair para termos ideias novas. Não são aventureiros como Morpheus,que resgatou Neo de dentro da Matrix, e o ensinou a pensar fora dela; são donosdo dinheiro e de muitas oportunidades (mas, não de todas — que fique claro), àespera de quem seja capaz de andar no vazio de um espaço desconhecido, às vezes,sem trajes especiais e um capacete.

Aempresa que exige criatividade precisa estar aberta às loucuras do mundo.Precisa estar fora da caixa, recrutando gente na porta de saída desse mundoretangular. A caixa é o próprio mundo. Sim, esse mesmo que os seus olhos sãocapazes de ver. E se você consegue percebê-lo de alguma “forma”, já seconformou com o seu formato. E isso não é um pecado. Será se você não serebelar.  A exótica criatividade que exigemestar em nossos novos currículos não é encontrada em qualquer lugar. O bicho éselvagem.

Aoassistir ao TEDxFAAP coma Michelle Schneider, percebi que, sim, o buraco é muito, mas, muito maisembaixo que se possa imaginar. E haja imaginação. Resumo da ópera: as máquinasvão ocupar a maciça maioria dos postos de trabalho que sobrarem de nossa atualcultura, e não dará tempo para, quem estiver no meio do caminho, aprender a seequilibrar sobre uma corda que treme sem parar; sem as bênçãos de uma rede logoabaixo para nos amparar, caso algo dê errado. Além disso, será preciso aprendero tempo todo, viver várias carreiras durante e vida; algumas, talvez, simultaneamente.

Pegou a visão?

Haverá, provavelmente, umcomputador capaz de substituir a inteligência de toda a humanidade. Isso, até2045. Sim, eu disse inteligência. Mas, existe uma diferença imensa entre consciênciae inteligência. Máquinas vão substituir o trabalho, em todas as situações quefor possível programar as suas funções. Isso vai acontecer pelo simples fato deque máquinas são mais eficientes e mais baratas do que a mão de obra humana.Ponto.

Mas, ainda existe uma questão: O que vamos fazer sem trabalhoe com a capacidade de consciência que ainda nos resta e nos torna únicos?

As habilidades inerentementehumanas como consciência, intuição, empatia, criatividade, etc., que sãoprodutos de um pedaço gelatinoso que se esconde dentro de nossas “caixas”cranianas, serão o divisor de águas em um mundo faminto por gente de verdade,que não se pareçam com as máquinas que operam. Precisamos aprender a pensarfora da caixa, mas, antes, aprender que o mundo está em constante mudanças, equase não é possível seguir o ritmo dessa quase paranoia. Pessoas têm emoções epodem ser comprometidas se não lidarmos de maneira saudável com cada uma delas.

Outrapalestra super interessante foi feita pela Sara Silveira, noTEDxFortaleza. “Tá todo mundo doido”. Piadas à parte, sim, há uma crise epercebe-se que há um clima de panela de pressão. Parece que existe algo prestesa explodir. Para a psicóloga estamos perdendo a capacidade de lidar com nossasemoções. Perdas, derrotas e morte são abafadas com todo tipo de recursos. Nãoqueremos encarar luto, fracassos e afins. Nos esquivamos o máximo que podemos,inclusive impondo a fórmula aos nossos filhos. Geração que cresce sem saber exatamentecomo é o gosto amargo da realidade.

Emum mundo duro, realmente é difícil parecer um super herói. Talvez você prefiraa saída do cientista Rick Sanchez, da série Rickand Morty; ele defende que não há sentido na vida, e, por isso, não faz amenor diferença qualquer uma de nossas escolhas. Mas, como disse o poetafrancês Paul Éluard: “dur désir de durer”. Ele escreveu sobre o que vem dentrode cada um de nós, a energia de prolongar nossos dias da melhor forma possível,traduzido duramente como o “duro desejo de durar”. Ou, talvez, você seja fã das “loucuras” de MuhammadAli, campeão mundial de boxe, que parecia ficar doido antes de cada luta. JoséTorres, um de seus adversários, disse que Ali sabia que “um soco que provoca onocaute é um soco que não se vê de onde vem”.

O novo século que desperta parece oferecer desafios tão insólitos que todo o conhecimento acumulado até aqui não será suficiente, já que pode ser armazenado e processado em qualquer computador médio. A única saída possível será o The Dark Side of the Moon. Não, nada a ver com o Pink Floyd (se bem que faz bem para amente). O lado escuro da lua aqui são as regiões ignoradas da nossa mente. Valorizamos demais habilidades técnicas a despeito daquilo que realmente nos manteve vivos até aqui: empatia e colaboração. Sem isso, seremos vencidos muito fácil por máquinas que simulam sorrisos elétricos. Um soco que sabemos de onde vem.

Passamosmuito tempo usando máquinas para tornar as nossas vidas melhores. Agora, que elasfazem todo o trabalho pesado, poderemos experimentar um estilo de vida maisleve e sem o peso da repetição. Mas, o duro desafio nessa batalha entre humanose máquinas será lidar com nossas emoções. A mente humana, uma caixa preta cheiade segredos, onde estão as respostas para nosso poder inventivo e as nossas maiorestragédias. “Pensar fora da caixa” exige não somente um novo currículo, mastambém fôlego e coragem para explorar um lugar para onde não existem mapas enem garantias de retorno seguro.

Talvezesse seja o convite silencioso que faz valer a pena a própria aventura.

Updater: William Barter

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