• Update or Die!
  • Posts
  • Woody vai pegar sarampo? O que esse surto tem a ver com você.

Woody vai pegar sarampo? O que esse surto tem a ver com você.

Caramba, você viu esse gráfico publicado pela Wired sobre o surto de sarampo na California?

Mostra o número de crianças com carteirinha de vacinação em dia, entre os filhos de funcionários das maiores empresas de tecnologia da California.

Quanto mais alta a barrinha, maior é o número de crianças imunizadas contra doenças infecciosas previníveis.

chartpixar

E lá no último lugar da fila… a Pixar!?

Surpreendentemente, menos da metade dos filhos dos funcionários da Pixar estão em dia com as vacinas. A maioria das crianças no Day Care da empresa não estão plenamente imunizadas.

E não é só na Pixar. No Google a situação é muito parecida.

Os dados são do California Department of Public Health, que faz este levantamento entre todas as crianças em day cares e escolinhas pré-primárias do estado. A Pixar já se pronuncionou e disse que os dados estão desatualizados e que é a favor da imunização das crianças, mas independentemente do número final, a comparação com as outras empresas parece ser válida já que a vigilância do Departamento de Saúde Pública deve ser a mesma para todas.

Mas vamos colocar a notícia de lado um pouco e pensar no que isso pode significar em termos comportamentais, assim dá para gente tentar imaginar um pouco melhor para onde vai nosso rebanho do bicho homem.

Essa nova onda de sarampo na California mostra um fenômeno novo: um surto ganhando força pela facilidade e disponibilidade de informação – e não pela falta dela, como sempre aconteceu. O Ebola ganha força pela falta de troca de informação entre as pessoas. O sarampo na California ganha força pela facilidade da troca de informações entre as pessoas. Afinal, estamos falando simplesmente do Google e da Pixar.

3 insights rápidos:

Você pode estar sentado sobre toda a informação do mundo, mas quem continua te influenciando mais ainda é o seu vizinho

O fato da informação circular com facilidade não significa que ela seja melhor.

Apesar de imaginarmos que essas pessoas tem à disposição todos os dados que quiserem sobre qualquer assunto, o movimento anti-vacinação ainda se apoia e se justifica através de argumentos muito frágeis do ponto de vista científico. Segundo a Wired, a principal fonte do movimento ainda é um artigo de um jornal de pouca credibilidade, associando a vacina com autismo. A segunda fonte mais influente é a ex-playmate Jenny McCarthy. Ou seja, é o famoso peer-pressure em ação, a influência das redes pessoais, formadas por amigos, conhecidos e parentes, que parece continuar sendo o fator decisivo na formação de opinião das pessoas. Como sempre foi, mas hoje é tudo muito mais efervescente por causa dos Facebooks e whatsapps e toda a parafernália que conecta o cardume humano.Nossa “lado humano”, no bom e no mal sentido, foi turbinado.Gênios são genializados.Imbecis são imbecilizados.

Conforto emocional em qualquer posição

Mais interessante ainda é notar que toda a informação que temos disponível hoje não nos faz, necessariamente, pensar melhor. Não desafiamos nossas opiniões nem nossas decisões. Envoltos por essa amigável rede que nos rodeia, cheia de pessoas dispostas a nos dar joinhas mais por afinidade do que por conteúdo, sofremos de outro surto: o viés da confirmação (“confirmation bias”), a falácia de filtrar só as coisas que reforcem nossas crenças, bloqueando tudo o que for contrário ao que a gente acredita. É aquela velha e boa “platéia amiga”, pronta para aplaudir, seja lá qual for a nossa bobagem da vez. Para auto-estima é ótimo, para reforçar laços de amizade também, mas não é o melhor ambiente quando precisamos testar de verdade nossas crenças e colocá-las em cheque.

Hitler é Deus? Com certeza dá para achar gente e argumentação para reforçar isso.Gosta de amarelo? Ou do azul? Pouco importa. Seja qual for sua posição não faltarão justificativas à sua disposição, nem tampouco um bando de gente para concordar com você. E isso pode ser realmente perigoso. A nova e atualizada “zona de conforto”. Pára pra pensar o que isso pode significar para você.  O incomodo é o que te faz andar pra frente, mudar.

Decisão pessoal, consequência geral.

No caso do Sarampo, a frase mais repetida ainda é “o filho é meu e faço o que eu achar melhor para ele”.E o doloroso rebate “O filho é seu, mas o sarampo pipoca em todo mundo”.Pela primeira vez na história estamos conectados pra valer, coisa de 200 anos, no máximo. E claro, tem o lado bom e o lado ruim. Com grande poder vem grande responsabilidade, o que obviamente não é uma coisa muito clara – diria até um conceito bastante flexível – na cabeça de algumas pessoas. E quando grande poder encontra grande irresponsabilidade, pessoas morrem metralhadas, corruptos surrupiam milhões de dinheiros e pessoas – e desgraças de grandes proporções passam a ser uma possibilidade. Cada vez maior.

Amarrando:

Enfim, não é um post para ser conclusivo em nada, são questões muito maiores do que eu poderia ter a pretensão de querer concluir, mas tem coisas aí para gente pensar.

O surto de sarampo nos Estados Unidos é apenas um exemplo de outros “surtos” que virão, fortalecidos e facilitados pelas redes que estamos construíndo em velocidade absurda. Aparentemente, apesar desses superpoderes que estamos ganhado diariamente, continuamos usando os mesmos métodos e raciocínios de sempre. Só estamos amplificando o mesmo jeito de ser de sempre. Quem sabe não é hora de parar para e pensar se não tem uma forma mais eficiente de tratar nossas crenças. Não precisamos tomar um partido em 30 segundos e passar a defendê-lo como se fosse time de futebol. Não precisamos comentar coisas antes de ler sobre essas coisas. Não precisamos estar certos sobre tudo, o tempo todo. Será que não dá para amadurecer a maneira como formamos nossas opiniões, sem tanta vaidade envolvida? Será que não é mais inteligente tentar derrubar suas verdades do que tentar mantê-las em pé a qualquer custo? Acho que talvez elas sejam que nem cabelo e cresçam mais fortes depois de cortadas, vai saber.

Um ponto positivo

Uma coisa legal que tenho reparado é que, nessa questão do sarampo, as discussões que seguem os posts estão amadurecendo rapidamente entre os gringos. Já tem gente que sabe argumentar, e fica apontando erros de raciocínio. Eles já falam sem pompa nenhuma coisas do tipo “isso é ad hominem”, para apontar acusações bobas de pessoais e conseguem aprumar a argumentação de um jeito muito bacana. Estão indo muito além do gosto/não gosto ou do concordo/não concordo, estão elaborando…e isso é ÓTIMO. Por aqui ainda estamos engatinhando nisso, não por falta de gente competente mas por imaturidade mesmo. Os mais eloquentes ainda são aqueles preocupados em mostrar que entendem do assunto ao invés de chacoalhar o assunto do jeito certo. Isso sem falar na turma da indignação gramatical exacerbada, a do caps locks, ou mesmo da pura e simples falta de educação. É a gordura do conteúdo, é o que nos breca, nos atrasa… um obstáculo que ainda precisamos resolver. Mas isso é outro post.

E por falar em outro post, vou ficando por aqui porque me empolguei no discurso e ficou longo, desculpe. Mas aproveite aí o surto de Sarampo para pensar em coisas da sua realidade e como podemos funcionar coletivamente de uma maneira mais inteligente e vantajosa para todos nós. Concorde, discorde, mas jamais deixe de pensar e questionar (principalmente a sí mesmo). Saber mudar de ideia é muito mais legal do que querer ter razão.

Updater: Wagner Brenner

Reply

or to participate.