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Workporn, o trabalho distorcido pelo Social Employer Branding

A maioria das empresas que conhecemos não existe.
Os empregos maravilhosos que vemos por aí, também não.
Cada vez mais, marcas, organizações e pessoas compartilham sua “versão social”. É como se cada um de nós tivesse uma versão particular do seu horário eleitoral gratuito.
São a expressão máxima do que chamo de Workporn, ou pornografia profissional (só usei um termo em inglês porque a tradução pode ser facilmente mal interpretada).
O que quero dizer é que o universo profissional assistido hoje em redes como o Linkedin e Instagram estão para o trabalho assim como o sexo real está para a pornografia. É um exagero, uma projeção, uma fantasia, quase sempre, desconectada da realidade.
É fácil encontrar um festival de tapinhas nas costas, pequenas vitórias transformadas em sagas, enaltecimento de marcas empregadoras e a espetacularização desproporcional do cotidiano, que transforma cada colaborador em mídia publicitária não remunerada (para tal fim).
A demissão virou textão (perdão pela rima pobre). O novo emprego também. Ganhou um caderno? Um mimo da empresa? Compartilhe, marque as pessoas, não basta existir, precisamos afirmar, reafirmar e midiatizar todos os momentos.
Assim, fazemos propaganda gratuita do nosso empregador, na expectativa de divulgarmos a nós mesmos. Atire a primeira pedra quem nunca…
Num mundo avaliado pela relação tempo/tela ou tela/clique, claro que o trabalho, que ocupa a maioria economicamente ativa do mundo seria afetado também.
A pandemia tornou-se o pesadelo dos gestores acostumados ao micro gerenciamento e obcecados por controle. A pressão e a vigilância aumentam a necessidade de “mostrar serviço” = provar estamos produtivos, trabalhando, engajados.
Pareço, logo existo.
Será que somos transparentes e justos com nossa realidade ou expomos uma fantasia idealizada?
Filosofando com um martelo de NIETZSCHE: “É inventando a mentira de um mundo ideal que se tira o valor da realidade, sua significação, sua veracidade… A mentira do ideal foi até agora a maldição que pesou sobre a realidade, a própria humanidade se tornou mentirosa e falsa até o mais fundo de seus instintos – até a adoração dos valores opostos àqueles que poderiam lhe garantir um belo crescimento, um futuro…”
Passo por inúmeras empresas todos os anos e é comum perceber o quanto os ambientes organizacionais adoecem as pessoas. Parte desse efeito colateral vem justamente da discrepância entre a aparência e a realidade vivida todos os dias.
É comum conversar com colaboradores que estão à beira de um ataque de nervos, desgastados, mas que, em seus perfis, amam, divulgam e defendem a própria cultura que os drena. Um dilema quase esquizofrênico.
A glorificação do “Eu Profissional”, geralmente vinculado a marcas e títulos bate de frente com a crise de propósito das já nem tão novas gerações, afinal, os primeiros representantes da Y fazem 40 anos em 2020. Obviamente, o mundo do trabalho também absorve a tendência, logo, todas as empresas se apressam em construir e divulgar seus propósitos, criados a fórceps, meio que enfiados guela abaixo, com um gole de publicidade para emplacar.
Vivemos uma corrida eterna contra a produtividade perdida na qual nunca há tempo suficiente e todos os meios nos dão a sensação de estarmos sempre mais atrasados ou devendo. Seguindo a dinâmica comparativa/competitiva que nossas timelines alimentam, é claro que essa sensação tende a aumentar. Em algum lugar, alguém sempre vai compartilhar algo “sensacional” que deveríamos estar fazendo.
Campanhas organizacionais alimentam uma espécie de cinismo corporativo coletivo. Uma comunicação que geralmente só fala e dificilmente escuta, mas quando escuta, não faz nada em relação ao que ouviu. No fim é como se fossemos todos cúmplices defendendo uma mentira coletiva para o mundo. Mentira talvez seja um termo pesado, prefiro a idealização ou essa versão pornográfica do trabalho, Workporn.
Será que eu estou exagerando? Role suas timelines antes de me responder:
Quantas pessoas de fato fazem e vivem o que falam e compartilham?
Por que espetacularizamos as banalidades do cotidiano?
Tantos falam em diversidade, mas quem tá praticando?
O propósito se constata na prática ou é apenas a versão 2.0 da missão, visão, valores estampados na parede?
Quantas regras e processos imobilizam o pensamento crítico?
Quantas consultorias fazem barulho mas não têm nenhum cliente por aí?
De quantos mentores realmente precisamos no mundo?
Quantos palestrantes sem experiência real daquilo que se propõem a falar?
Quantos coaches perdidos em suas carreiras passaram a orientar a dos outros?
Quantos CEOs de soluções que não existem?
Quantas startups de fachada você conhece?
Quantos nomes de cargos inventados para enobrecer o currículo?
Quantas empresas vendem ambientes incríveis que não refletem a realidade de seus colaboradores?
O quanto vivemos o presente real ao invés do compartilhamento de uma versão idealizada?
Por que precisamos dessas métricas de vaidade?
Updater: Paulo Emediato
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